Não sei se foi há dois meses ou há dois anos que me
deixaste. Sei que levaste contigo ou levaste de mim a dor que nunca quisemos
que existisse. Foram tempos em que tentei ignorar, tentei esquecer mas a tua
imagem apertava-me o corpo e a alma, dilacerava o meu íntimo e eu não queria
ver... Havia a obrigação de te acompanhar, mal o fiz, eu sei... Mas sei também
que não me quererias a teu lado, assim... Tu, a minha avó, sim minha e só
minha! Que deixas marcada na minha alma a lucidez do amor, a garra da servidão,
a alegria de ser e a procura de mais… Fiz no tempo uma marca, o antes e o
agora. E entre o sempre e o hoje, quero esquecer como tu já o fizeste, há 2
meses ou há um ano. Agora que me doi, preciso falar antes que o bom senso e a
vida calem o que me grita cá dentro.
Sinto-te em todo o lado. Sinto-te em mim. Estás no meu
quarto quando me deito, estás na cozinha quando te recordo, está em mim, em
todo o lado. Tive medo, tanto medo quando o senti... agora desejo-o e só queria
uma prova que és real e não a minha insanidade cheia de saudades. É
reconfortante esta presença, mesmo que atente contra o meu acreditar, é o
quente da avenida e o quente da vida que ainda transborda do teu olhar, aquele
que eu quero recordar... os teus olhos verdes raiados de mel e a realização de
um dever, sentido, de mãe e mulher!
No Verão, quando estivemos juntas, os teus olhos
dilaceraram-me, o negro, profundo, cerrado... já não estavas comigo... aqui!
Disse-te: Até já avó... Foi aqui que passei a linha... e cheguei ao hoje.
O meu luto estava feito, tu sabes, quando olhei a minha
roupa, quando guardei aquela roupa preta...
Quis saber se estavas bonita, como querias… Queria eu essa
fé, seria mais feliz!
Fica comigo avó, preciso de ti, preciso entender esta imagem
que obsessivamente me assola, e és tu… que eu obsessivamente admiro e amo.
Tenho rezado, à tua maneira e à minha maneira… e depois
adormeço, feliz e preocupada e cheia de saudades.
Tenho medo do que aí vem… tenho medo do medo….
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