Retratos a lápis

Fingi que tinha um poial, um poial na porta da minha casa, onde me sentei no final dum dia de trabalho árduo, para descansar.
Ao longe há o som da festa, o São João aqui na aldeia tem uma fogueira e tudo, quando passámos as crianças queimavam alcachofras e alguns casais dançavam na frente de uma espécie de palco onde alguém fazia aparecer uma musica acertada para uma festa de São João. Havia manjericos e numas metades improvisadas de contentores de óleo, acho eu, assavam-se entremeadas e febras! É a festa numa aldeia onde moro e onde moram talvez mais umas 150 pessoas. Não, não é melhor que na cidade, é diferente!
Aqui sento-me no poial e olho a lua, ouço a musica da festa, de manhã cheira a pão e a eucalipto. o silêncio por vezes passa por aqui e eleva-me.
sentada no poial vi a mulher que descia a rua. Saída do trabalho ia encontrar-se com a filha, filha de 14 anos que dançava na festa, os olhos estava molhados de lágrimas, não perguntei porquê, não consegui. Ela descia a rua e eu no poial, havia de a subir novamente com a filha e a mãe, doente e sem emprego. Marido não conhecia, apenas alguém que lhe massacrava a existência parca de horizontes... sim, aqui os horizontes são limitados e as pessoas entretêm-se a falar daquilo que melhor conhecem... talvez a vida dos vizinhos. Chega a ser cruel. A aldeia tem o pão quente e o porco que a vizinha matou, mas não tem perspectivas nem horizontes... e assim ficamos, eu no poial, ela a descer a rua e a festa lá no fundo, onde o fumo da fogueira já entrava na minha casa.
o que eu queria? Ter companhia para dançar ao som desta musica e talvez queima uma alcachofra que não me picasse os dedos...
E a mulher... que sonhe... e viva e seja feliz! Como eu sou aqui, sentada no poial imaginado da minha casa!

1 comentário:

Sandra disse...

Lindo...maravilhoso este texto...mexeu com todos os meus sentidos...
bjs